"O mundo do faz de conta lado a lado com a realidade"

segunda-feira, 4 de junho de 2007

AS MULHERES DE PAULA REGO























"...para encontrarmos o nosso caminho para onde quer que seja, temos sempre de encontrar a nossa própria porta de entrada, tal qual a "Alice no País das Maravilhas".


O uso estratégico e subversivo da violência, como arma de denúncia política, tanto no campo social quanto privado, é uma constante na estética da artista portuguesa Paula Figueiroa Rego, que em suas obras de impacto, transcreve angustiosas histórias contadas por mulheres. Narrativas que há tempos esperavam para serem expostas e que encontraram, através da pintora, vozes para se tornarem públicas.

Pelo viés do abuso de poder, quer emocional, quer sexualmente falando, Paula Rego expressa, através de sua visão feminina, o retrato da família tradicional e da relação mãe-filha, alegoricamente trabalhada em seus contos de fadas travestidos, como por exemplo, na peça em destaque: "A Branca de Neve", que entre outros ícones extraídos do rol da Disney, habita o inferno contemporâneo de sua alma intimista.

O Mundo Fabuloso apresenta Paula Rego como uma contadora de histórias visuais que reinterpretou velhas rimas e inocentes canções de embalar, por meio de sua peculiar leitura "às avessas". Mas houve um momento em que os contos de fadas, lendas e mitos deram espaço à sua primeira e ousada incursão ao catálogo literário português. Com “O Crime do Padre Amaro” de Eça de Queiroz, Paula, entre 1997 e 1998, reflete sobre um romance lusitano que fez com que suas obras cursassem por uma atividade mais social, em vez de permanecer com interpretações que se encontram apenas nos contos infantis.

Acompanhe, agora, as reflexões que Paula Rego faz sobre um de seus trabalhos mais expressivos, Mulher-Cão:

"Mulher-Cão é a coisa que eu tenho mais orgulho de ter feito, porque é uma mulher sozinha, mas que ainda morde. Uma mulher só, num canto, contra a parede, que não pode fugir, mas que arreganha o dente e que morde! Morde até ao fim, luta até ao fim, apanha pancada, mas lá vai lutando sempre! E depois, essa "Mulher-Cão" apareceu, "apareceu-me"! Essas coisas acontecem, não é? E então eu pensei, esta mulher vai levar-me a sítios onde eu nunca fui, vai ser o meu guia. E assim foi. E comecei através da "Mulher-Cão" a tocar partes da minha vida que eu não tinha tido nunca coragem, nem oportunidade de fazer, nem sabia como lá chegar. Mas com ela, lá fui fazendo: o "Bad Dog", a humilhação, o amor, a lealdade e a submissão cúmplice das mulheres, um certo masoquismo das mulheres, no amor e na traição … O casamento é uma espécie de mortalha, não é? É a "mulher-bicho" que tem força através da sua animalidade, é a parte física, dos instintos, que é muito importante! O silêncio tácito das mulheres, a sua "endurance" e o seu sentido de honra”.

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